Os dados abaixo referem-se a uma pesquisa sobre o mecenato no período de 2000 a 2008.

Mito:
A renúncia fiscal para a cultura é volumosa, R$ 1,5 bilhão/ano.

Realidade:
A cultura representa 1,46% do total anual autorizado pelo governo. A grande beneficiária é a área de Comércio e Serviços (26%), em segundo lugar a Indústria (20%), em terceiro lugar o Trabalho (12%) e em quarto lugar a Saúde (11%).

Mito:
O Sudeste “suga” da Lei Rouanet, 80% dos recursos disponíveis.

Realidade:
. Os produtores culturais podem estar sediados no Sudeste, porém seus trabalhos são realizados nas diversas regiões do Brasil e não há estatística contrária a esse argumento. Há programas nacionais praticados pelo Itaú Cultural, pela Fundação Roberto Marinho, pela Fundação Vale do Rio Doce, entre outras.
. 66% da população brasileira reside na região Sudeste. Se há distorção, é de 14% dos R$ 1,5 bilhão da renúncia, no valor de R$ 210 milhões. O FNC poderia compensar este valor.

Mito:
Há concentração de recursos em áreas específicas (música e teatro).

Realidade:
Entre 2000 e 2008, a renúncia foi distribuída da seguinte forma:

%
19,67 – Música
19,43 – Artes Cênicas
15,90 – Patrimônio Cultural
13,25 – Artes Integradas
11,62 – Humanidades
11,01 – Audiovisual
09,11 – Artes Visuais

Mito:
Os valores médios por projeto são altíssimos.

Realidade:

tabela

Apresento, a seguir, alguns pontos que acredito ser necessário para a área da Cultura do Estado de São Paulo. Não tenho a pretensão de esgotar o assunto e muito menos de ser o dono da verdade.
Elegi as seguintes áreas de ação: formação, difusão, fomento, memória, patrimônio histórico e as minorias. E, da mesma forma, as áreas de expressão: música, literatura, artes cênicas (dança, teatro e circo), cinema, memória e artes plásticas. Acompanho o atual desenho da organização da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo.

FORMAÇÃO

A Formação é a área de ação a ser privilegiada, ao contrário de alguns teóricos, que propõem a difusão e o fomento como prioridades. Como área de expressão, elejo o ensino musical como o de maior capacidade de amplitude. Caberia uma ação massificada em primeiro lugar, para atender aos jovens. Como segundo passo, atuar na formação de professores e de virtuosos (músicos e maestros).
A ação massificadora ocorrerá quando a escola fundamental e a de ensino médio agir em conjunto com a cultura. Seria facultativa a todos os alunos da rede pública, a possibilidade de desenvolver seus talentos, habilidades e interesses musicais. Seria uma ação abrangente para qualquer gênero musical ou instrumental. Vale tudo para motivar, criar, ouvir e compartilhar.
São Paulo possui cinco milhões de estudantes na rede pública com jovens entre 08 e 19 anos. A Inglaterra possui 7,5 milhões e iniciou, em 2000, o trabalho de inserção da música em seu currículo escolar. O número de praticantes cresce ano a ano e, simultaneamente, há uma melhora do rendimento escolar e uma redução dos índices de violência. Devíamos imitá-los, sem inventar.
Nós conhecemos o receituário do combate à marginalidade, o que não conseguimos é aplicá-lo com tenacidade. Talvez falte estímulo aos professores e aos alunos, mas por meio do ensino musical atuante, a nossa história será diferente.
Outras expressões são importantes: artes cênicas e literatura (leitura). Caberia ao Estado, ampliar o atual programa Fábrica de Cultura a todas as periferias das grandes cidades paulistas, atuando em cada região onde a cidadania precisa ganhar da violência e da ignorância. Nas Fábricas, ensinamos a encenar, dirigir, trabalhar em grupo e trabalhar o corpo: desinibir-se, ouvir o próximo, melhorar a auto-estima para transformar a vida, e, se possível, tornar-se um agente social de transformação.
Com o ensino da música, da dança e do teatro, formaremos, sem dúvida, uma pessoa melhor.
Quanto à literatura (leitura), o assunto é, na verdade, o acesso aos livros, documentos, trabalhos e conteúdo de internet. Nessa condição, precisamos de um ponto de encontro: a biblioteca. Deveríamos fazer de cada um dos espaços voltados para livros e internet, um local para a formação. Serão nossos futuros professores, cientistas, agentes culturais, formadores de opinião, artistas, empreendedores, empresários, servidores públicos e trabalhadores que construirão nossa realidade com maior eficácia e eficiência.
Com as três ações: música, artes cênicas e leitura, daríamos cabo da ignorância e diminuiríamos a violência. Portanto, investindo nessas áreas e na juventude, economizaremos ações de repressão e presídios – temas nefastos.
Quais os tipos de investimento que seriam necessários, além daqueles já realizados? Todas as escolas deveriam possuir salas para o ensino musical e um auditório para apresentações. Faz parte do aprendizado musical a exibição do trabalho realizado, seja solo ou em conjunto, são temáticas complementares. Ao desenvolver a capacidade motora, psíquica e de inteligência proporcionada pela música, o ato de exibir o resultado aguça a auto-estima, além de desinibir o praticante. Portanto, professores, salas de ensaio, auditórios, instrumentos, partituras, mobiliários, computadores, mesas de som e demais acessórios são os componentes necessários para a formação musical. Se houver uma ação massiça, programada para 10 anos, atenderemos quatro milhões de jovens da rede pública por ano no final desse período.
Como governo, devemos procurar as duas vertentes da administração: a eficiência (fazer mais com os mesmos recursos), e a eficácia (fazer o certo, o aprovado, o que precisa ser feito). A somatória das duas vertentes é a excelência. O ensino musical, portanto, é uma excelência a ser alcançada.
Para o cinema e as artes plásticas, as universidades públicas e particulares dão conta da formação nessas duas expressões.
Porém, há uma lacuna a ser preenchida: a escola de restauro. Deixarei para comentar quando tratarmos do patrimônio histórico.

DIFUSÃO
A Unidade de Difusão atende o Estado por meio dos seguintes programas:

1. Circuito Cultural Paulista
2. Virada Cultural
3. Vá ao Cinema
4. Festivais: Mantiqueira (literatura); Limeira (circo)
5. Viagens Literárias
6. Revelando São Paulo
7. Convênios com Municípios

O próximo governo deveria ampliar sua ação, preferencialmente, no programa Circuito Cultural e na expansão de salas de cinema. A amplitude do programa Circuito Cultural Paulista passaria pela construção de auditórios, arenas e palcos permanentes nas cidades que se proponham a uma parceria com o Estado. A criação de um programa de construção de auditórios e arenas é uma exigência para o crescimento da área cultural.
Haverá sustentabilidade para a cadeia cultural do Estado quando as principais cidades se prepararem para receber cada vez mais e apropriadamente: espetáculos de ópera, orquestras e conjuntos de MPB de alcance nacional. A parceria entre Estado e Município crescerá muito mais quando ocorrer parcerias com as grandes empresas que atendam o mercado de consumo. Esse será o ponto a ser desenvolvido e que proporcionará uma alavanca sem precedentes à nossa atividade. São Paulo possui 645 municípios, dos quais, menos de 5% possuem condições adequadas e permanentes para receber programas culturais. Seria importante que o próximo governo preparasse um plano para atingir, pelo menos, a meta de 120 municípios com condições de receber eventos nacionais. Seriam arenas, auditórios e teatros. Quando viajamos, podemos perceber quantos estádios de futebol estão abandonados e poderiam ser transformados em arenas culturais.
Na capital de São Paulo, construiremos o maior complexo cultural do País: o Complexo Cultural da Luz, com 100 mil metros quadrados, três teatros, duas escolas e uma biblioteca. O investimento estimado é de R$ 600 milhões, financiados pelo BNDES e pelo BID, simultaneamente. A sua execução é muito importante, pois confirmaremos a Cidade de São Paulo como a capital latino americana da cultura.

FOMENTO
O governo paulista criou a sua lei de incentivo no final de 2006. A lei está atrelada à arrecadação estadual do Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços ao limite de 0,2 %, e devemos lutar para praticá-lo. Assim, os atuais R$ 60 milhões disponíveis poderiam chegar a R$ 260 milhões.

MEMÓRIA
O esforço de criar novos espaços para as artes visuais estará completo quando a terceira unidade da Pinacoteca do Estado estiver construída (2011).
O atual programa de museus realizou a construção do Catavento, um espaço de iniciação científica, o Museu do Futebol, e entregará até o final do ano o novo edifício que abrigará o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, o maior museu da América Latina para essa expressão artística, com 33 mil metros quadrados. Até o final deste ano e início do próximo, serão completadas as reformas de outros quatro museus: Arte Sacra, Memorial do Imigrante e Portinari.

O grande desafio da próxima gestão é dar preferência aos museus ou fóruns de elementos de sustentabilidade (meio-ambiente, água e energia) para uma relação harmoniosa entre meio ambiente e desenvolvimento econômico. Dessa forma, proponho a criação de unidades que exponham e debatam esses elementos. São eles:

1. Exposição e discussão sobre os biomas brasileiros – seria um espaço de 12 a 15 mil metros quadrados, onde os biomas possam ser apresentados e discutidos. Conheceríamos os Pampas, a Mata Atlântica, o Serrado, o Pantanal, a Caatinga e a Amazônia.
2. Água – a Sabesp já possui um projeto. O Estado deveria encampá-lo e ampliá-lo ao máximo, para divulgar a importância da preservação dos mananciais, apresentá-los de forma singular, atrativa e marcante.
3. Energia – tema explorado pela Fundação do Patrimônio Histórico da Energia de São Paulo. Porém, deveríamos reordená-lo para que as fontes de energia fóssil, solar, biomassa, hidráulica (maré, aeólica e hidroelétrica) e atômica fossem amplamente debatidas e apresentadas.
4. O Museu da História Natural e da Antropologia revela o importante acervo existente em nossas universidades. Seria a mesma atitude que tomamos quando da reforma do antigo prédio do DETRAN, no bairro do Ibirapuera, para transformá-lo na nova sede do Museu de Arte Contemporânea da USP.
Por fim, os museus históricos. A criação do Museu de História de São Paulo é um passo importante para a configuração de museus, como apoio ao ensino fundamental e médio. Da mesma forma, a ampliação do Museu Paulista da USP, que nos revela muito da história do Brasil. Essa ação deve ser apoiada pelo titular da Secretaria da Cultura.
As quatro unidades científicas e os museus de história representariam um marco definitivo no complexo cultural e científico do Estado de São Paulo.

PATRIMÔNIO HISTÓRICO
Nesta área, há três ações a serem desenvolvidas: a reformulação do marco legal, o aprimoramento do Condephaat, mais ágil e prestativo e a criação da Escola de Restauro de São Paulo.
A reformulação do marco legal é necessária para redefinir o papel do Estado na preservação e tombamento de bens patrimoniados. Hoje, não temos os critérios escritos que nos levam a proteger bens, paisagens e bairros. Creio que precisamos rever a forma e a responsabilidade do tombamento. Se o bem é realmente importante e o proprietário, por desleixo ou por carência econômica, não consegue mantê-lo, caberia ao Estado desapropriá-lo e, por meio de licitação, revendê-los a quem possa restaurá-los. O Estado não pode arcar com os recursos que devem ser empregados na formação dos jovens.
O segundo ponto é o aprimoramento do Condephaat, redefinindo-o como gestor e redimensionando-o. Um importante desafio é definir o que é função do Estado e o que é função do Município.
O terceiro ponto, a criação da Escola de Restauro de São Paulo, voltada para as áreas de artes plásticas, construção (séculos XVIII, XIX e XX) e objetos. Não temos, porém precisamos de maior número de profissionais para operacionalizar o restauro da nossa memória.

MINORIAS
Apontamos ações relevantes de ordem cultural porém, é fundamental que as ações influenciem no sentido de maior tolerância, reconhecimento e respeito à diversidade de raça, etnia e opção sexual. Devemos adotar de forma natural, a criação de uma unidade especial para o debate permanente desse tema dentro da nossa Secretaria.
Resta-nos desejar boa sorte ao futuro Secretário da Cultura do Estado e sua equipe. Que Deus os proteja e o Governador também.

Ronaldo Bianchi

O governo federal quer alterar o financiamento público de cultura da sua esfera, propondo um Projeto de Lei. Bom se fosse para melhorar, e parece que o projeto não melhora o atual. Por quê?

1) Hoje, há duas alíquotas para as empresas abaterem do Imposto de Renda a pagar: 100% ou 70%. O projeto propõe 100% para quem aplicar em Fundos, o que é bom, porém, para quem aplicar em projetos de produção independente fora dos fundos, as alíquotas oscilarão entre 40 e 80% com critérios a serem estabelecidos por decreto. Portanto, diminui também a segurança jurídica, hoje lei, amanhã decreto.

2) A contribuição das pessoas físicas, hoje 100%, amanhã 80%. Se a participação era inexpressiva, no futuro será nula. O PGBL (Plano de Previdência Privada) levará 100% da renúncia.

3) A lei Rouanet é “imortal”, ou seja, como aprovada antes da lei de responsabilidade fiscal, não depende de revisão a cada cinco anos.
Caso o PL seja aprovado na forma proposta, obrigatoriamente, precisará ser reexaminada a cada cinco anos, podendo ou não ser aprovada, conforme estabelecido na lei de responsabilidade fiscal.

4) Os museus e entidades sem fins lucrativos ligados às diversas expressões culturais, como por exemplo: a música erudita e instrumental, perderão a possibilidade de dedução da alíquota de 100%. As novas alíquotas oscilarão entre 40 e 80%. A aprovação nesses termos será um duro revés aos projetos com reduzido apelo mercadológico.

5) Hoje, quem capta recursos pode receber até 10% do valor captado ou o limite determinado pelo Ministério. A nova versão exclui essa remuneração. Perderemos dinamismo de execução da renúncia. Quem faz, não sabe vender. São ações excludentes.

6) A criação de nove fundos, como a criação de conselhos por expressão artística, exigirá uma máquina burocrática de que o atual Ministério não dispõe.

7) Reduzir o coeficiente de desconto da parte administrativa a 10%, contra os 15% atuais é uma sangria desnecessária. Fazer cultura custa administrativamente mais do que os 10% propostos.

8) A reformulação das nomeações dos membros de conselhos não parece democrática, muito menos transparente. No momento, o ministro escolhe uma lista tríplice, no futuro, indicará sem ouvir ninguém.

9) Não está definido como serão praticados os limites estabelecidos com relação ao total da renúncia para cada entidade, cada projeto e pelo conjunto das organizações sociais. Será o critério pelo captado ou pela ordem de chegada? Na primeira hipótese, o excesso será constatado a posteriori. Na segunda opção, por ordem de chegada, será a “corrida maluca”, muitos que podem captar não estarão autorizados. Será renúncia.

Vamos às virtudes:

1) Regulamenta o FNC, hierarquizando as suas aplicações, e oferece 100% a quem contribuir.

2) Como idéia, é justo dar incentivo menor a quem faz marketing cultural. É fundamental acabar com o capitalismo cultural sem risco. Quem quer distribuir lucro deve ter incentivo reduzido. O projeto vai bem nesse sentido.

3) Colocar o Ficarte para funcionar é boa tentativa.

Ronaldo Bianchi

Este artigo deveria ser o primeiro da série. Neste, apontarei as falhas conceituais e contradições que embasam o PL – Procultura.

1) O Minc justifica a supressão da Lei Rouanet “devido às distorções produzidas pelo seu exercício nos seus 18 anos de existência”.

Comentários:
Uma lei não gera distorções, gera conseqüências. Da mesma forma que esse PL transformado em lei, portanto, uma afirmação equivocada. A Lei Rouanet possui três mecanismos: Mecenato, Fundo Nacional de Cultura e Ficarte.

O ataque do Minc à Lei Rouanet localiza-se no exercício do Mecenato, que foi e é incentivado pelo próprio Minc por meio de uma renúncia fiscal. Pelo Mecenato, as empresas e pessoas físicas aplicam seus impostos a pagar em projetos ou programas previamente autorizados pelo Minc, através da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, cujo presidente é o Senhor Ministro. Portanto, se há a aludida distorção, ocorre com a autorização e o incentivo do Minc.
Qualquer distorção pode ser corrigida hoje, por meio do Fundo Nacional de Cultura, portanto, dispensável o Procultura.

O Minc ampliou a renúncia fiscal (mecenato) de R$ 400 milhões para R$ 1,2 bilhão, e agora quer destruir o que construiu. Não dá para entender!

2) Há uma mensagem sureptícia na campanha para aprovar o PL: “A nova lei atenderá a todos”.

Comentários:
. Se fosse verdadeira, seria boa, mas não é. O Minc deveria informar quanto depositará nos fundos para atender a todos.
. Por exemplo, o Minc afirma que somente 20% dos programas aprovados são beneficiados pela renúncia – R$ 1,2 bilhão em 2009 – portanto, para atender a todos (80%), deveria depositar no FNC mais R$ 6 bilhões. Fará isto?
Eu não li ainda qual será o compromisso de recursos que o governo aportará para acabar com as distorções. Ouço somente a catilinária: “Morte à Rouanet, que serve ao Sudeste e, em particular, os produtores e instituições paulistas”, como se São Paulo não fosse parte do Brasil.

3) “A Consulta pública amadurece a proposta”.

Comentários:
Foram sete anos de consulta para parir um PL que deforma o sistema de financiamento público da cultura.
As consultas do Minc sempre foram dirigidas a dar “pau” na lei Rouanet do começo ao fim dos encontros, palestras, seminários e entrevistas. Nenhuma qualidade, só apontam defeitos. Por que demoraram sete anos para desmontá-la? E por que ampliaram os seus recursos?

4) Na verdade, a supressão da Rouanet esconde a vontade política de apequenar a produção das entidades e dos produtores independentes. É uma proposta que asfixia o mecenato, pois o PL concede de 40 a 80% da renúncia, conforme critérios a serem estabelecidos em decreto. Sobrará às empresas, aplicar:
a) Na lei do audiovisual, oferecendo 125 % de retorno
b) Na lei do esporte, 100%
c) Os novos Fundos, 100%
d) No Ficarte, 100% até 2014

Pergunto:
Qual a empresa ou a pessoa física que aplicará em projetos e programas, com retorno fiscal entre 40 e 80% e restrito a 0,5% da renúncia? Ou seja, a partir da aprovação desse PL, nenhum proponente poderá captar mais do que 0,5% do valor da renúncia. Assim, o proponente poderá, no máximo, angariar R$ 6 milhões, enquanto que o patrocinador descontará entre R$ 2,4 a R$ 4,2 milhões de seu imposto a pagar. “Sobrarão” museus, institutos, programas e projetos da sociedade civil.

Os produtores, segundo a mesma propaganda, poderão vender seus projetos aos “gestores” do Ficarte. Quantos sobreviverão? Poucos, com certeza.
A proposta do PL é estressante, mal formulada, inoportuna e abjeta.
Estressante – porque acirra ao limite a resistência dos produtores e das entidades culturais independentes.

Mal formulada:
a) não explica como acabará com as alegadas “distorções” da Rouanet, poderiam resolvê-las já, alocando mais recursos do FNC da Rouanet,
b) mata o atual Mecenato e desloca acintosamente o poder para as mãos dos futuros “donos” do Ficarte e do próprio governo.

Inoportuna:
a) o governo está propondo uma mudança de hábito adquirido há 18 anos, que resultará em deslocamento de investimento para outras áreas como esporte e cinema,
b) O mercado quer garantia jurídica a longo prazo, e o PL quebra a confiança dos patrocinadores, pois torna o marco legal instável.

Abjeta porque:
Era hora de unir, somar e multiplicar. O Minc propõe desunir, diminuir e dividir. Joga o Brasil contra o Sudeste e não faz conta de que somos 66% da população. Se hoje essa região detém 80% do mecenato, a distorção é de 14%. Em valor: R$ 240 milhões. Portanto, passível de correção imediata pelo FNC.

Cabe ao Congresso barrar esse PL ou o Minc revisá-lo.

Ronaldo Bianchi

Este é o segundo artigo sobre o projeto de lei do governo federal para substituir a Lei Rouanet. No primeiro, apontei algumas dificuldades e virtudes. Agora, vou simular situações que os proponentes encontrarão se aprovado o PL. Tomarei como modelo, os estudos de caso quando era estudante de graduação da FGV/SP. Meus professores enunciavam os casos com nomes fictícios para as empresas, geralmente, problemas ligados a custos, má gestão e oportunidades de mercado. Nesse sentido, para não haver melindre, também usarei nomes fantasia.

CASO 1
As Organizações Sociais do Estado de Emergência poderão angariar recursos federais por meio dessa nova lei?
a) As Organizações Sociais de todos os estados da federação podem, no limite e no conjunto, angariar 10% da renúncia fiscal vigente. Portanto, se a renúncia é de R$ 1 bilhão, a somatória das renúncias para organizações sociais no país não poderá exceder R$ 100 milhões.
b) Cada Organização Social poderá, no máximo, pleitear até 0,5 % da renúncia, ou seja, R$ 5 milhões.
c) Os seus patrocinadores poderão descontar entre 40 e 80% de sua contribuição, dependendo do que lhes for autorizado pelo Conselho de sua área de expansão.

Seguem alternativas para a situação:
a) A Organização Social ficar a zero.
b) Se conseguir autorização, será menor do que R$ 5 milhões.
c) Os patrocinadores poderão descontar entre R$ 2 e 4 milhões de sua contribuição.

CASO 2
O que a organização sem fins lucrativos que realiza a trienal na cidade de Passaperna poderá obter do novo mecenato?
A organização da trienal na cidade de Passaperna poderá pleitear no máximo R$ 5 milhões. Seus patrocinadores poderão abater, no máximo, de 40 a 80% desse valor, ou seja, R$ 2 a 4 milhões. Imagine a situação de certas Bienais.

CASO 3
O Museu do Solavanco poderá contar com a nova lei para seu Plano Anual?
Sim, o Plano Anual do Museu do Solavanco seguirá os mesmos padrões do caso anterior.

CASO 4
A Organização Tabajara, formada por um conjunto de empresas com fins lucrativos, decidiu e há 10 anos implantou o Instituto Cultural Tabajara. A organização poderá descontar do IR, as contribuições que efetuou ao instituto que leva seu nome?

Sim, a Organização Tabajara poderá descontar, no máximo, 0,5% do total da remissão, se for R$ 1 bilhão, será R$ 5 milhões. Destas, 40% serão passíveis de desconto no IR, ou seja, R$ 2 milhões. Isto se aprovado sem ressalvas pelo Ministério.

Haveria mais dois casos a serem explorados: o pleiteante do Fundo Nacional de Cultura e a formação do Ficarte. Este, passível de receber contribuição totalmente dedutível até 2014, quando as contribuições serão reduzidas a 75%.

Deixo de comentá-los por não estarem regulamentadas, seria fruto de imaginação.
Podemos concluir, apontando qual será o novo cenário a partir da aprovação integral desse PL.
A proposta cultural, se transportada a condição ecológica, metaforicamente sairíamos da Mata Atlântica direto para o deserto do Saara, sem passar pelo serrado e pela caatinga.
Quanto ao Ficart, se for regulamentado como a Funcine, deverá ser o caminho para a formação de cartéis culturais. Em outras palavras, bancos e financeiras recolherão recursos a custo zero, totalmente dedutíveis por quatro anos, e aplicarão, a seu critério, em quem lhes interessar e pelo maior retorno.

Em relação ao Fundo Nacional de Cultura, realizará sua obrigação: equilibrar o desbalanceado e proteger o indefeso.

Continuo acreditando na inteligência dos nossos parlamentares para examinar com cautela, o amanhã cultural. Para mim, se esse PL for aprovado, o cenário será de terra arrasada, onde reinarão:

1) O governo pelo FNC, e
2) Os grupos gestores do Ficart
As importantes instituições culturais brasileiras, formadas por empresas e pela sociedade civil no bojo de um marco legal estável, serão desmontadas ou reduzidas a atuações pequenas e inexpressivas.
Os produtores pequenos e médios dependerão ainda mais das bancas de aprovação dos Fundos e dos futuros gestores do Ficart. Triste e inaceitável.

Ronaldo Bianchi

Nós nos aproximamos de mais um importante momento democrático: eleições majoritárias e congressionais. Dia 3 de outubro de 2010 elegeremos nossos representantes na Câmara (4 anos), dois terços de nossos senadores (8 anos), nosso governador e nosso presidente (para os próximos 4 anos). Para quem acredita, é a oportunidade de uma boa virada. O que precisamos para escolher bem nossos candidatos?
Os candidatos devem expor claramente seus programas quanto: à educação, à saúde, ao saneamento básico, à infraestrutura, ao desenvolvimento, à habitação e à administração da máquina pública.
Caso o candidato não tenha opinião sobre os itens elencados, caro eleitor, não vote nele. O candidato tem outros interesses, que não o coletivo.

Perguntas aos candidatos a Governador e Presidente:

. Qual a estratégia para melhorar os indicadores atuais de cada área mencionada?
. Qual a sua meta para ao final dos quatro anos para distinguir-se da herança que recebeu?
. Como administrará a máquina estatal para alcançar os objetivos propostos? Aumentará impostos ou reduzirá o seu custeio?

O que desejamos por área:

Educação – quanto ao aluno, ao concluir o ensino médio, saiba: ler, fazer contas, conhecer história, química, física e biologia, pelo menos.

Saúde – que possamos entrar em um hospital público e sermos atendidos prontamente por médicos e enfermeiros interessados em nos salvar, por meio de seu talento, de equipamentos que funcionem e com suprimento médico. Em 2000, eu enfartei, dei entrada em um PS Municipal de São Paulo, fui prontamente atendido, porém não conseguiram definir a extensão de meu problema (o aparelho de eletrocardiograma não funcionou), não puderam aplacar minha dor (não havia medicamento), não conseguiram diluir meu sangue (não havia anticoagulante). Sem opção, puseram-me na ambulância direto para o hospital particular mais próximo, de onde saí dez dias depois com um “stent” no coração. Se eu permanecesse no PS, estaria morto. Quantos já não morreram pelos mesmos motivos?

Saneamento Básico – os indicadores do Plano Nacional de Amostra de Domicílios apresentaram os seguintes resultados em 2008:
Em São Paulo, a rede de água urbana atendeu a 99% da população, enquanto, no Brasil, o índice é de 96%.
A situação da rede de esgoto é de 92,8% de domicílios atendidos em São Paulo, enquanto o índice nacional aponta 58,9%.
Fica claro que é na coleta de esgoto e seu tratamento que os candidatos devem apresentar propostas.

Infraestrutura – temos três temas nesta área: reformulação da matriz de transporte interestadual, transporte urbano e portos.
. Quanto ao transporte interestadual, nossas rodovias federais estão um “osso”, encarecendo nosso custo de vida. O transporte ferroviário, que é mais barato e econômico para cargas e pessoas, foi relegado a segundo plano. Por quê?
. Em termos de transporte urbano, quantos quilômetros de metrô serão construídos? Gastamos muito tempo para trabalhar, nos sobra pouco para o lazer, Rio de Janeiro e São Paulo são as cidades prioritárias.
. Os portos precisam de modernização imediata. A entrada e a saída de mercadorias representam desenvolvimento econômico. O Estado não pode ficar refém de interesses corporativos que impeçam nosso crescimento.

Desenvolvimento – no mínimo, proibir que funcionem indústrias, agricultura ou serviços que poluam nosso ar, nossa água e nosso corpo, não é? Sabemos quem são? Se sabemos, é dever público definir prazos definitivos a cada um deles para zerar a conta da agressão ambiental. Desenvolver, poluindo, será fatal para a nossa vida e do nosso planeta. O Estado não suporta corrigir mazelas de um sistema produtivo destruidor. Melhor trocar a matriz de oferta de produto à população.

Habitação – aos que não vão às periferias de cidades brasileiras, façam o favor de entrar no Google Map e passear pelos bairros paulistas do Jaçanã, Capão Redondo, Jardim São Luiz, Brasilândia e Cidade Tiradentes, para começar.
O planejamento urbano deste país parou nos anos 70. Coincidência ou não, na ditadura, que acabou há 24 anos, e a habitação do brasileiro continua precária. Quando acabaremos com a falta de moradia? E o mais importante: onde construí-las?

. Por fim, a máquina pública. Será preciso aumentá-la? Não seria melhor contratar o mercado e a sociedade civil, ou seja, empresas e organizações sem fins lucrativos para fornecer serviços melhores à população? Será que só funcionários públicos podem e devem educar, medicar, aculturar e zelar pelos nossos cidadãos e bens públicos?

Precisamos de um Estado com menor custo e maior capacidade de investimento, sem aumentar impostos.
Esses são alguns dos desafios do Estado, precisamos votar em candidatos que já provaram sua capacidade de realização.

Ronaldo Bianchi

O governo federal quer alterar o financiamento público de cultura da sua esfera, propondo um Projeto de Lei. Bom se fosse para melhorar, e parece que o projeto não melhora o atual. Por quê?

1) Hoje, há duas alíquotas para as empresas abaterem do Imposto de Renda a pagar: 100% ou 70%. O projeto propõe 100% para quem aplicar em Fundos, o que é bom, porém, para quem aplicar em projetos de produção independente fora dos fundos, as alíquotas oscilarão entre 40 e 80% com critérios a serem estabelecidos por decreto. Portanto, diminui também a segurança jurídica, hoje lei, amanhã decreto.

2) A contribuição das pessoas físicas, hoje 100%, amanhã 80%. Se a participação era inexpressiva, no futuro será nula. O PGBL (Plano de Previdência Privada) levará 100% da renúncia.

3) A lei Rouanet é “imortal”, ou seja, como aprovada antes da lei de responsabilidade fiscal, não depende de revisão a cada cinco anos.
Caso o PL seja aprovado na forma proposta, obrigatoriamente, precisará ser reexaminada a cada cinco anos, podendo ou não ser aprovada, conforme estabelecido na lei de responsabilidade fiscal.

4) Os museus e entidades sem fins lucrativos ligados às diversas expressões culturais, como por exemplo: a música erudita e instrumental, perderão a possibilidade de dedução da alíquota de 100%. As novas alíquotas oscilarão entre 40 e 80%. A aprovação nesses termos será um duro revés aos projetos com reduzido apelo mercadológico.

5) Hoje, quem capta recursos pode receber até 10% do valor captado ou o limite determinado pelo Ministério. A nova versão exclui essa remuneração. Perderemos dinamismo de execução da renúncia. Quem faz, não sabe vender. São ações excludentes.

6) A criação de nove fundos, como a criação de conselhos por expressão artística, exigirá uma máquina burocrática de que o atual Ministério não dispõe.

7) Reduzir o coeficiente de desconto da parte administrativa a 10%, contra os 15% atuais é uma sangria desnecessária. Fazer cultura custa administrativamente mais do que os 10% propostos.

8) A reformulação das nomeações dos membros de conselhos não parece democrática, muito menos transparente. No momento, o ministro escolhe uma lista tríplice, no futuro, indicará sem ouvir ninguém.

9) Não está definido como serão praticados os limites estabelecidos com relação ao total da renúncia para cada entidade, cada projeto e pelo conjunto das organizações sociais. Será o critério pelo captado ou pela ordem de chegada? Na primeira hipótese, o excesso será constatado a posteriori. Na segunda opção, por ordem de chegada, será a “corrida maluca”, muitos que podem captar não estarão autorizados. Será renúncia.

Vamos às virtudes:

1) Regulamenta o FNC, hierarquizando as suas aplicações, e oferece 100% a quem contribuir.

2) Como idéia, é justo dar incentivo menor a quem faz marketing cultural. É fundamental acabar com o capitalismo cultural sem risco. Quem quer distribuir lucro deve ter incentivo reduzido. O projeto vai bem nesse sentido.

3) Colocar o Ficarte para funcionar é boa tentativa.

Ronaldo Bianchi

A partir de 2011, a legislação obrigará o ensino de música em nossas escolas. Muitos acreditam ser uma medida precipitada, pois nem bem ensinamos português e matemática, como vamos empreender mais uma matéria? Aos céticos, aos que duvidam da viabilidade, e aos eternos do contra, temos uma resposta: a música ajudará muito o aprendizado das matérias convencionais.

Desde 2000, o Reino Unido implantou o ensino musical obrigatório nas escolas. Por quê? Chegaram à conclusão de que a música compõe um leque de qualidades para o desenvolvimento dos jovens.
Entre essas qualidades:

. Desperta a criatividade, atuando nos dois hemisférios do cérebro.
. Desenvolve a disciplina. Por meio da prática contínua de um instrumento, o jovem organiza-se no tempo e no espaço.
. Alavanca o patamar da auto-estima para o alto, fator primordial para atingir um estado de alegria e conforto consigo mesmo.
. Desenvolve o senso de interdependência, proporcionando a socialização mais rápida e lúdica de quem a pratica.
. Atua na formação de grupos coesos. Além do reconhecimento do trabalho coletivo que melhora a integração das pessoas.
. Eleva o grau de tolerância entre os diferentes, ou seja, aumenta o respeito à diversidade. Mesmo diferentes, podemos nos gostar e nos respeitar, seja qual for a opção de cada um.
Além dessas qualidades, a música oferece uma quantidade superior de alternativas, se comparada a outras expressões artísticas. Apontamos as seguintes:
– A variedade de tipos de instrumento: cordas, percussão, sopro, eletrônicos e teclado.
– Tecnologias: hoje a computação é amplamente utilizada na composição e execução musical, além da forma convencional de tocar e compor.
– Gêneros: erudito, jazz, hip-hop, pop, samba, tango, MPB, sertanejo, e um sem número de regionais de todas as partes do mundo.

. A música não fala uma língua em particular, é um código de sinais. Do chinês ao grego, basta conhecer as notas, seus sustenidos, o tempo musical. É um processo matemático, o sinal determina a sua execução.
Os resultados desses últimos 10 anos tem sido profícuos, mas há decerto muito a se fazer. O Reino Unido possui 25 mil professores de música que utilizam a internet como meio de difusão de suas experiências, dificuldades e, também, para a sua atualização. Da mesma forma, os alunos da rede escolar. Há problemas? Sim, há uma avaliação do ensino realizado através de uma agência, sob a responsabilidade do Parlamento. Os resultados dos últimos quatro anos apontam para o seguinte: ¼ das escolas superaram o estabelecido, outro ¼ atingiu a meta, ou seja, 50% das escolas chegaram lá, os outros 50% estão a caminho. Essa, talvez, seja a nossa diferença, querer tudo agora e “já”.

Nossos recursos escassos não deveriam ser encarados como empecilhos, mas simplesmente como o que eles são: obstáculos a serem superados. O Reino Unido possui universidades com 700 anos, mas ainda tem dificuldades para formar bons professores. Em vez de se penalizarem, enxergam como uma grande oportunidade a ser conquistada.

O Reino Unido, assim como toda a Europa, está sob forte onda migratória proveniente do leste europeu, da Ásia, da América Latina e da África. São continentes que despejam no velho continente ocidental, milhares de imigrantes com a esperança de melhorar de vida. Surgem, portanto, necessidades extraordinárias de investimento nas áreas de educação, saúde e habitação. Além disso, a própria decadência industrial e a ascendência da economia de serviços tem legado a cada país, contingentes de pessoas que não conseguem desenvolver novas habilidades para o seu exercício. Esse contingente de pessoas ocupa as periferias das cidades como nômades sociais. Pior, viciaram-se em álcool ou outras drogas na esperança de encontrar alívio para seu desespero cotidiano.

O que vemos hoje no Brasil? Será que nossa taxa de alcoolismo é muito inferior ao 1/4 da população adulta inglesa ou nossas crianças superam o 1/5 das crianças escocesas que não conhecem seus pais? Não afirmo e não desminto. Tenho algumas certezas quanto ao ensino musical nas escolas brasileiras:

. As crianças encontrarão professores dedicados, e muitos a serem treinados.
. Um ambiente saudável para seu desenvolvimento intelectual e emocional
. Não haverá falta de recursos humanos e nem de material. Como exemplo da abundância, veja o Programa de Aceleração do Crescimento.
. Nosso país transpira e respira música. Quando implantado, o ensino musical terá uma profusão de incentivos, daremos certo
. Nossa busca será incansável pela excelência do ensino musical e faremos um programa de êxito
. Hoje, temos mais de 50 milhões de jovens entre 5 e 19 anos, distribuídos pelas cinco regiões (norte, nordeste, centro-oeste, sudeste e sul) à procura de um bom destino.

Vamos acelerar no sentido de garantir um futuro próspero e seguro à juventude. O ensino musical obrigatório é um dos vetores para essa conquista. Sabemos que será uma luta árdua, mas o esforço físico, material e intelectual dessa empreitada será recompensador.

Ronaldo Bianchi

A Convenção de Haia de 1947, confere aos povos, pelo menos, o direito a:

1) Insurgir-se contra um governo opressor
2) Lutar de todas as formas pelo restabelecimento da democracia, quando essa foi deposta por golpes de Estado
3) Impedir, por todos os meios, a ocupação de seu território por forças inimigas.

Ninguém duvida da validade jurídica de Nurenberg, nem das resistências francesa, holandesa, polonesa e russa contra a opressão alemã, duvida?

Pois bem, a partir de abril de 1964, o povo brasileiro adquiriu esse direito (insurgir-se contra um governo opressor) pelo fato de o estado de direito ter sido suprimido, quando nosso país vivia o exercício pleno da democracia. Agrupamentos militares, com o apoio de organizações civis e de governo estrangeiro, derrubaram o Governo eleito de João Goulart, instalando-se como governo provisório à revelia da nação.

A partir dessa “vitória”, iniciaram o processo de expurgo político de parlamentares, professores e funcionários públicos que não compartilhavam das suas orientações, e que ofereciam resistência aos seus propósitos autoritários.

A mordaça à sociedade Brasileira foi instalada. Grupos políticos discordantes iniciaram a resistência no sentido de reivindicar o restabelecimento da normalidade democrática: retorno das eleições para cargos majoritários, anulação das punições políticas, revogação dos atos institucionais, o fim da perseguição aos adversários.

A ditadura, que propunha um tempo breve para o retorno democrático, traiu sua promessa aos aliados civis. Ela determinou sua perpetuação, negou a revisão de seus atos e determinou a perseguição implacável aos seus adversários.

Os grupos políticos mais combativos partiram para a luta armada. Outros se engajaram na oposição permitida dentro do Movimento Democrático Brasileiro, ou resistiram como puderam: através da imprensa, da mobilização artística e das organizações sindicais.

A luta armada não foi uma opção a princípio, e sim a posteriori. Lutaram para derrubar um Governo que se instalou a revelia, subvertendo a ordem estabelecida.

O sistema autoritário alimentou-se no sentido de quanto maior a resistência, maior a repressão. O período agudo ocorreu quando a máquina militar desenvolveu o aparelho repressor paramilitar, resultando em prisões, deportações, torturas e assassinatos. Foram ações à revelia da lei e do Estado.

Creio que a proposta da comissão da verdade é o primeiro ato concreto para esclarecermos os fatos e limparmos nosso passado.

Deveríamos limpar nosso passado, esclarecendo os pontos obscuros. Usando a mesma forma que os Aliados da II Guerra; julgarando os facínoras nazistas em Nurenberg, se permitido pelo Supremo Tribunal Federal.
O julgamento dos torturadores e assassinos, bem, isto cabe à justiça decidir o alcance da Lei da Anistia vis a vis e aos Estatutos Internacionais dos Direitos Humanos de que o Brasil é signatário

Ronaldo Bianchi

Os candidatos a presidente deverão apresentar suas prioridades nas áreas: econômica, social e cultural. A mais extensa e de maior impacto será a agenda econômica, afinal, a partir dela as outras se desenvolvem.

As discussões da área econômica se concentrarão quanto às políticas: cambiais, de juros, de desenvolvimento, tributária e previdenciária.

O segundo ponto é a política social. A disputa pelo reconhecimento de quem foi o melhor: PT ou PSDB. Não há dúvida, o governo Fernando Henrique criou os processos de amparo sócio-econômico aos desprovidos. O PT desenvolveu o que o PSDB colocou na rua. O Lula fracassou no “Fome Zero” e salvou-se com o “Bolsa Família” de Fernando Henrique.

Os petistas gostariam de que Serra acabasse com o “Bolsa Família”, mas estão enganados, pois Serra dará maior amplitude e eficiência ao sistema.

Quanto à cultura:

. O governo Lula deve ao Partido Verde a conduta propositiva do Ministério. Foi uma disputa palmo a palmo com o PT, mas o PV soube acomodar o aliado e o prestigiar.

. Se o PV administrasse exclusivamente o Minc, poderíamos ter avançado muito mais. O Ministério perdeu energia em disputas internas, mas mesmo assim, conseguiu aumentar o seu orçamento e o da renúncia fiscal. Propôs a lei do vale-cultura que, se aprovada, será muito interessante ao país.

Por outro lado, ao eleito cabe repassar as leis de incentivo: Rouanet e Audiovisual.
Por último, ficou de fora da agenda cultural até hoje, a formação em artes. Nenhum dos governos federais de qualquer partido preocupou-se com o ensino artístico dos jovens e com a formação de professores.

Portanto, existem duas oportunidades a serem captadas: o da formação de professores e a dos jovens. No caso dos jovens, o objetivo é torná-los: desinibidos, autoconfiantes e protagonistas de suas vidas.

Quem ganhar também deveria, entre outras ações:

1) Construir centros culturais nas periferias das grandes cidades para que a juventude receba instrução artística;
2) Fomentar o ensino artístico nas escolas públicas;
3) Oferecer bolsas em academias e escolas particulares de dança, de teatro e de música àqueles que precisam.

Portanto, o desafio já existe. O governo Serra abriu o cenário: construindo nove centros culturais denominados “Fábricas de Cultura”, localizadas na periferia da cidade de São Paulo. Serão exemplos para outros governos e, nelas, os jovens construirão espetáculos usando, principalmente, a música, a dança e o teatro como forma de desinibição e projeção de seu futuro.

Nossa esperança reside na concentração de recursos na área de formação artística, seja por meio do orçamento da cultura, que deveria ser ampliado para essa função, seja por meio do engajamento da área de educação.

Ronaldo Bianchi