As mudanças em empresas profissionalizadas nacionais ou multinacionais distinguem-se das familiares, particularmente, por não possuir em seus quadros dirigentes, membros familiares dos principais acionistas. Em algum momento histórico, as empresas familiares tornam-se profissionalizadas. Não afirmo que uma seja melhor administrada do que outra. Temos vários exemplos onde dirigentes profissionais deram espetáculos de incompetência. Vimos nitidamente em 2008, quando o sistema financeiro americano apresentou fragilidades inimagináveis. Foi uma concatenação de incompetência e irresponsabilidade, redundando em uma crise sem precedentes desde 1929.

O que aconteceu?

Podemos ter certeza de que o sistema estava desgovernado no sentido amplo do conceito.
A regulamentação muito aberta propiciou aos “profissionais” da área financeira incorrer em operações destruidoras de valor. Produziram o que aqui no Brasil é ilegal, a pirâmide da felicidade. Ganhos aos membros do topo e prejuízo aos da base.

Profissionais ávidos a arrematarem bônus imediatos, mesmo ao custo da vida de suas organizações a longo prazo. Destacaram-se do princípio elementar de suas responsabilidades: preservar o patrimônio de suas organizações e de seus clientes.

Os membros dos Conselhos de Administração, de forma consciente ou inconsciente, endossaram as operações deletérias em suas organizações. Por que agiram dessa forma?

Onde estavam os acionistas majoritários? Provavelmente fartando-se com os lucros fáceis por anos, propiciados por executivos inescrupulosos. A fábula do Pinochio deveria ser lembrada por todos.
Por fim, as empresas que venderam consultorias estratégicas, operacionais e auditorias. Elas se renderam à inércia e, se alertaram, não foram ouvidas e caso não tenham apontado o que estava em risco, deixaram de cumprir sua missão. Elas deveriam aprender o básico: quem paga nem sempre tem razão. O papel do consultor é relatar a sua verdade e propor ações no campo da realidade, não cabe fantasiá-la.

O que aconteceu ainda será revelado. Ouvimos poucas explicações convincentes sobre os prejuízos. Levaremos muitos anos para recuperar as perdas. Nossa dívida interna aumentou porque renunciamos à receita de impostos sobre produtos no sentido de evitar a queda do consumo. Essa conta será paga.
Portanto, não podemos acreditar na tese de que a escolha de dirigentes das empresas profissionalmente orientadas seja melhor do que a sucessão em empresas familiares.
A sucessão em empresas profissionalizadas deveria seguir um trajeto diferenciado:

Avaliação psicológica no sentido de evitar que essas empresas sejam dirigidas por personalidades perturbadas nas suas mais diversas manifestações.
O Conselho, como os dirigentes, deveria ser composto por personalidades determinadas a proteger os valores da sociedade, antes mesmo dos interesses dos acionistas.
Os dirigentes profissionais e os conselheiros deveriam, a priori, declarar seus bens nas datas de posse e deixá-los em garantia à empresa.

O governo, por sua vez, deveria:
Acompanhar as principais empresas do país e agir preventivamente antes da eclosão de uma crise da empresa ou do setor.
Apurar com celeridade os fatos e processar os responsáveis.
Impedir a continuidade ou exigir novos dirigentes para empresas que obrigaram o Estado a intervir no sentido de regularizar os desequilíbrios estruturais ou conjunturais causados por má gestão.

Vimos que a mão invisível do mercado é incapaz de corrigir ações de dirigentes e de sistemas desregulamentados. A sociedade não merece pagar por incompetências privadas.

Ronaldo Bianchi

Quando escrevi o artigo anterior sobre sucessão em empresas familiares, não havia sido publicada a fraude nas operações do Banco Panamericano.

Vou explorar um pouco essa situação constrangedora para autoridades bancárias, mercado financeiro, empresas de auditoria, funcionários e dirigentes não envolvidos. Almejo a revelação integral, seguida de punição dos culpados. É o mínimo que o governo e o empresariado financeiro devem nos oferecer.

Em primeiro lugar, não se trata de uma crise sistêmica como a incorrida no caso do Banco Marka e Fontecindam. Por quê? O sistema financeiro nacional não corre risco de insolvência. A crise poderia ter implodido o banco, e somente ele na figura de seus acionistas e correntistas. Não havia como não há até o momento, nenhum outro banco envolvido. A fraude descapitalizou o banco Panamericano e só.

Quais são os panoramas possíveis? Um já ocorreu: o fundo garantidor abasteceu o Panamericano de recursos para enfrentar a inadimplência imediata, no sentido de evitar o pânico dos depositantes (correntistas).

O controlador, Senor Abravanel, deu em garantia todos os seus bens e participações em outras empresas. Ganhou dez anos para desmobilizá-los, recuperar o banco e devolver o empréstimo ao fundo. O segundo panorama é a recuperação das organizações SS.

Para uma pessoa de 79 anos, ativa e cumpridora de seus deveres foi uma traulitada e tanto. Anos de empenho coletivo, podendo acabar em pó. Ele deve se perguntar: o que aconteceu?

Essa ocorrência evidencia que nenhuma empresa está a salvo de um revés ou até de vários. No caso de Abravanel, crise não combina com seu perfil. Conta a lenda que um dia ao chegar em casa, uma senhora o abordou, declarando-se sua cliente na empresa de seguro-saúde. Revelou a situação de seu filho, que se encontrava entre a vida e a morte, internado em um hospital que se negava a aceitar o convênio médico. Abravanel, sem titubear, fez dois telefonemas: o primeiro para o diretor de sua empresa de seguro, exigindo que o hospital cumprisse as cláusulas contratuais ou pagaria do próprio bolso pelo atendimento imediato do jovem. O segundo telefonema foi para o presidente de suas empresas, exigindo que a seguradora fosse vendida no dia seguinte, ao preço que fosse. Quando argüido do porquê, foi ao ponto: “não quero ter em minha biografia, a responsabilidade pela morte de ninguém. A imprensa iria me esmagar no primeiro óbito discutível, por conseqüência, eu perderia a confiabilidade da freguesia”.

Abravanel estava correto. Saberemos em breve qual o conjunto de ações que selarão o destino do Grupo SS. Abravanel é um patrão destemido, irá atrás daqueles que o lesaram. A sorte poderá bater mais uma vez em seus ombros, retornando tudo à normalidade. Será uma nova vida, uma dádiva. Deverá, como um doente recuperado, praticar novos métodos, mais contidos, menos impulsivos. Em outras palavras, mais estratégico e menos operacional.

Fica para o Sr. Abravanel caminhar mais seguro. Acreditar no processo participativo, nos sinais de perigo (eles existiram), nos sistemas de denúncia e de acompanhamento, livrando-se daqueles que não o alertaram.

O terceiro panorama é a liquidação das empresas, fato angustiante e indesejável. O personagem Sílvio Santos não merece esse fim, nem o seu criador, Senor Abravanel.

Boa sorte aos que trabalharão para recuperar o prestigiado Grupo SS e ao sistema brasileiro de auditoria bancária.

Ronaldo Bianchi

A sucessão em empresas, assim como em governo, tem suas particularidades e dissonâncias.

Reconhecemos pelo menos dois tipos de sucessão empresarial: de empresas familiares e as de notória profissionalização. Vamos comentar sobre as familiares em primeiro lugar e num próximo artigo, a sucessão em empresas profissionalizadas.

No processo sucessório em empresas familiares, o indicado para assumir a direção pode não ser o mais qualificado, dado a escolha ser decorrente de avaliações equivocadas. Vocês já ouviram com certeza a história do primogênito da família, guindado ao primeiro cargo por ocasião da morte do então presidente ou “dono”, quase sempre conduzindo a organização ao fracasso. Esse fato é quase uma freqüência, mais no passado do que no presente.

Se nas empresas profissionalizadas o processo de sucessão é doloroso, nas familiares é pior. Nessas, confundem-se os papéis de pais, irmãos e primos. Aspectos como culpas, afeições e rejeições afloram entre os herdeiros. Nessas empresas, o melhor seria acertar um plano de quem comprará quem, definindo-se o plano de sucessão sem disputas. Se a empresa for de porte nacional, a sucessão poderá ser profissionalizada, contratando-se consultorias especializadas para avaliar quais dos herdeiros possuem condições de disputar a direção máxima. A partir daí, a escolha será encaminhada.

A sucessão exitosa deixará seqüelas da mesma forma que uma sucessão fracassada. Portanto, o melhor a fazer será procurar o êxito dentro de um confronto, do que numa conciliação que redundará em fracasso. Aqueles que ficarem pelo caminho, poderão atuar em outros campos, com melhor desempenho e qualidade de vida. Aos que ficam, ao que vier a ser alçado à direção superior, uma certeza: serão cobrados diuturnamente pelos acionistas herdeiros.

Outra alternativa, talvez a mais apropriada para grandes empresas familiares, tem sido a profissionalização da direção executiva. Os acionistas poderão ser deslocados para o Conselho de Administração, sendo aí representados por seus familiares mais atuantes ou mesmo por conselheiros profissionais.

A decisão nesse tipo de empresa familiar (a de escopo nacional) é muito difícil. Cabe ao atual dirigente máximo da família, avaliar se há sucessor no seio familiar à altura dos desafios da organização. Se não houver nenhum claramente à vista, ele poderá encaminhar sua sucessão dentro dos seguintes caminhos:

1. Vender a empresa, distribuindo o apurado entre os herdeiros;

2. Profissionalizar a direção, criando um conselho que represente os sócios; e

3. Arriscar o mais improvável: “acertar” um sucessor que leve “jeito” dentro da família. Porém, sabendo que será um estágio probatório, ou seja, por um tempo determinado, sob sua tutela. O tempo e as circunstâncias poderão decidir a pendência para um eventual acerto ou para as duas alternativas anteriores.

No próximo artigo, vamos avaliar a sucessão nas empresas profissionalizadas, sejam ou não familiares.

No caso de governo em regime democrático, o processo de escolha dos dirigentes e o processo de mudança são muito mais complexos.

Tratarei desse assunto proximamente, aproveitando as sucessões dos estados e da federação