A democracia brasileira é ciclicamente confrontada por elementos autoritários que justificam suas ações como corretivas de uma situação que poderá fugir ao controle ou a reposição da ordem.  No primeiro período republicano surgiu o Tenentismo para confrontar e depor a oligarquia café com leite, representada pelas elites econômicas paulista (café) e a mineira (leite). A partir desta proposta eclodem a rebelião dos 18 do Forte de Copacabana em 5 de julho de 1922, desmontada no dia seguinte. Em 5 de junho de 1924 os tenentistas provocam um novo levante em são Paulo. As consequências foram graves. 500 civil foram mortos e a cidade bombardeada. Conseguiram derrubá-la com a revolução de 30, onde Getúlio Vargas foi entronizado como líder e assumiram o poder.  A partir dá, os tenentes progrediram na vida hierarquia militar, assumiram comandados de ministérios e de tropas. Com a deposição de Vargas, Dutra deu continuidade aos seus princípios. A eleição de Vargas em 1950, já outra a aliança. Eduardo Gomes pela UDN foi derrotado. O partido abrigava ideais tenentista e de outras elites emergentes como Carlos Lacerda. Foram implacáveis na oposição, até Getúlio sair da visa e entrar para história. Nas eleições 1955, o candidato é um tenentista raiz – Juarez Távora que perdeu. Em 10 de novembro 1955 tentam um golpe usando argumento que a diferença dos votos entre os dois candidatos (Juscelino e Távora) – 500 mil eram oriundos dos comunistas que estavam banidos do processo eleitoral. O então ministro da Guerra – General Lott- impede o golpe. Juscelino sofre nova tentativa de golpe, agora pela aeronáutica, em fevereiro de 1956 com a revolta de Jacareacanga -base área no Pará, com a pretensão de impedir a continuidade do governo. Vencidos, Juscelino contemporiza e o perdoa os envolvidos. Mesmo assim, em 1959 eclode uma nova revolta, a de Aragarças, com a intenção de bombardear o Palácio Presidencial – Catete. A revolta foi frustrada e os revoltosos fogem para países vizinhos e retornam depois da posse de Jânio Quadros, eleito pelo partido UDN de Carlos Lacerda, Juarez Távora e Eduardo Gomes. O golpe de 1964 surge da mesma aliança civil militar – antigos tenentistas e a União Democrática Nacional (UDN). Militares e civis alinharam-se para derrubar Jango. Motivo: governo de inspiração comunista e corrupto. A democracia brasileira sucumbiu por 21 anos frente aos ideários dos antigos e sempre presentes tenentista, aos interesse estratégicos americanos e a direita partidária.

A nova república surge em 1985.  O processo de redemocratização foi lidera por Tancredo, Montoro, Ulysses e por mérito da articulação de ampla aliança democrática. Passados 31 anos, revivemos momentos de instabilidade. O presidente Bolsonaro eleito em 2018, foi um afastado das Forças Armadas por indisciplina. Era um tenente, quando aposentado, virou capitão. A partir de 2019 as palavras do presidente são dedicadas para ameaçar o processo democrático brasileiro ao invés de governar o país. Ressurge em suas sentenças o jargão tenentista conservador de praxe (corrupção e comunismos), agora ampliado com a ascensão de grupos evangélicos. Agora argumenta que o processo eleitoral sem voto impresso é corrupto. As urnas seriam vulneráveis. Argumenta que se não fosse, teria vencido em primeiro turno em 2018, como Aécio Neves teria ganho de Dilma em 2014. Ameaça a nação por meio de uma nova “cruzada”: o retorno do voto impresso acoplado a urna eletrônica ou não haverá eleição. Assim colocado, iremos impedi-lo.

As eleições de 2022 ocorrerão apesar das ameaças inconstitucionais e sugestivamente golpistas do presidente Bolsonaro. Há 30 anos nossas eleições são realizadas por sistema de urnas eletrônicas invioláveis. Colocar em dúvida agora o sistema é oportunismo de quem se vê confrontado pela desordem de seu governo. Não acredito que as mortes da pandemia sejam somente da incompetência desse governo, é algo mais complexo. Creio que a incompetência em não realizar um governo prometido é o centro da desordem. A acuado e com a visão de uma derrota acachapante em 2022, Bolsonaro alterou o rumo (se um dia teve) das suas alianças. Agregou no seu núcleo político uma aliança oportunista, a que lidera o Congresso, além das outras que o elegeu. O que assistimos é a agonia de um projeto fracassado. O incessante discurso sobre vulnerabilidade da urna eletrônica, não cola. É uma denúncia vazia. Não há nenhuma prova relato expresso. Se pretende um golpe fracassará: não tem apoio dos USA, de amplos setores empresariais e sociais. O que vemos?  Um presidente medíocre, incapaz, amedrontado, que cultiva a instabilidade institucional e a achincalha valores democráticos. Ele imagina-se se perpetuar no poder, como outros déspotas, mas não tem talento, é medíocre. Não avançará.

Ronaldo Bianchi