Como tenho afirmado nos artigos anteriores, o futuro é previsível. Mas quando não é? Quando ocorrerem ou não, sucessivamente, os seguintes fatos:

1. Qualquer fenômeno natural ou incêndio que destrua fisicamente a única unidade da empresa. Nesse momento, escoam-se as esperanças de reerguê-la, perdendo-se o futuro.

2. Desapropriação: da mesma forma que os fenômenos naturais, quando a unidade for desapropriada pelo Estado. Dificilmente, há condições para desmonte e remonte da empresa. Hoje, melhor do que no passado, há uma indenização mais próxima da realidade imobiliária. Porém, quando se tratar de indústria, a peritagem oficial é despreparada para avaliar, criteriosamente, os custos do desmonte e remonte de máquinas e equipamentos. Dessa forma, a empresa deverá arcar com verbas indenizatórias menores do que as necessárias para a sua continuidade operacional. Esse fato é uma tragédia na vida das empresas e, em particular, das que possuem somente uma unidade. Acrescente-se os custos de indenização de funcionários, suspensão de entrada de recursos e de margem de lucro.

Essas duas situações representam o que há de pior, se comparadas à incompetência administrativa, desinteligência entre sócios, roubos contínuos executados por funcionários, políticas econômicas governamentais, sucessão mal organizada, obsolescência de máquinas e equipamentos, imaturidade gerencial, má escolha de investimentos, senilidade ou doença fatal do fundador, falta de coragem para dar um basta a desatinos praticados pelos sócios, a sonegação fiscal flagrada pelo fisco, e conduta criminosa dos dirigentes.

A maioria dessas outras causas da fatalidade das organizações que comprometem o seu futuro poderá ser corrigida a tempo. Como? No caso de intervenção, cabe a montagem de um conselho, profissionalização dos cargos executivos e o afastamento dos responsáveis pelos desatinos.

Há outras formas como: a venda, a associação ou o fechamento da empresa. Não há receita para a solução dos fenômenos naturais e desapropriação, porém a escolha da sede deve preceder um estudo aprofundado das condições locais quanto a:

. Disponibilidade efetiva da guarnição de bombeiros.

. Do histórico dos fenômenos naturais: vendaval, enchentes.

. Se há estudo, mesmo que futuros da instalação de algum empreendimento público (aeroporto, hospital, escola, estrada e outros).

Ronaldo Bianchi

Podemos examinar uma organização por meio de vários pontos visíveis, tais como: portfólio de produtos; marcas; mercado de atuação; dirigentes; estrutura de governança; tratamento dispensado aos funcionários; pagamento de impostos em dia; quantidade de ações tributárias e trabalhistas; percepção da imprensa; quais associações e sindicatos contribui e participa; se já foi objeto de estudo de escolas de administração e publicidade; tratamento dado às reclamações de colaboradores, clientes e fornecedores; e se existem pendências nos cartórios de protesto.

Existem pontos que não enxergamos, como por exemplo: lucratividade (no caso de empresas limitadas e sociedades anônimas de capital fechado); porcentagem de domínios de mercado; mau relacionamento entre sócios e conselheiros; qualidade dos fornecedores; processo decisório; atualidade de tecnologias e equipamentos; futuro portfólio; qualidade da força de venda; integridade dos dirigentes e dos funcionários; estruturação dos processos seletivos, de incentivos e demissionais; defesas diante da crise; características criativas, propositivas e reativas.

Verificando e pesquisando tanto o lado visível quanto prospectando aspectos não visíveis, podemos analisar e avaliar a previsibilidade das organizações quanto a sua perenidade por determinado período de tempo.

Caso a organização não atenda positivamente os aspectos visíveis em, pelo menos, 70%, ela estará, em breve, em situação de perigo estrutural. As organizações com atendimento negativo ou abaixo de 50%, com certeza, estão em turbulência. O mesmo vale para os aspectos invisíveis e a soma das duas possibilidades. Há organizações que não atendem 50% de positividade, porém estão em posição de monopólio ou dentro de um mercado cartelizado.

A vida dessas organizações, com certeza, será maior do que daquelas que operam em mercado de concorrência direta. Porém, nenhuma sociedade ou governo agüenta desaforos e má administração em tempo integral. Portanto, faz bem exercer as qualidades positivas à semelhança dos organismos biológicos: exercícios constantes, boa alimentação, costumes regrados e sem exageros, respeito aos limites físicos.

Faz bem à saúde de qualquer ser vivo, assim como das organizações. Para quem estiver bem, o futuro é previsível a curto e médio prazo. Agora, para quem menospreza o mercado, a sociedade e seus colaboradores, com certeza, estará em maus lençóis em algum momento futuro. Portanto, seu futuro também é previsível.

Ronaldo Bianchi

Os cuidados com alguns fundamentos das organizações definem as suas capacidades relativas à longevidade e às forças de superação nas crises.

Quais seriam os fundamentos mais evidentes?

1. Capacidade de investimento – as empresas que descuidam da renovação, atualização e aumento de sua produtividade constante assinam um atestado de óbito prematuramente. Essa “fatura” será cobrada pela falta de investimento, ou pior, pela incapacidade da organização em conseguir investir. Quando? Outras empresas começarem a abocanhar nacos de seu mercado, ou quando uma importante crise setorial abater sobre o mercado. Nesse momento, sua estrutura deverá:

a) Estar enxuta (pela produtividade).
b) Com custos a prova de crise, em outras palavras, projetar lucros mesmo quando a demanda se retrair.
c) Ter flexibilidade na linha de produção (dada a sua modernização).
d) Apresentar preços competitivos aos padrões internacionais.

2. Integração e treinamento da equipe – as empresas com o melhor modelo de compromisso com sua força de trabalho poderá superar as adversidades com melhor possibilidade de êxito do que aquelas que enxergam os recursos humanos como custo, fardo, mal necessário, ou não passam de números. As empresas que remuneram pelo êxito, desempenho individual e por grupo e geral serão mais bem recompensadas do que aquelas que não compartilham seus resultados.

3. A profissionalização da administração – tenho o comando familiar como um importante fator de empreender dentro de cenários adversos. Há que reconhecer o valor daqueles que visionaram oportunidades, quando outros as enxergaram como obstáculos. Focar na solução e não no problema faz a diferença. Porém, tudo dá certo por um tempo, e não por tempo indefinido, seja qual for a organização. Enxergar o momento certo de o empreendedor compartilhar com os empresários (da família ou profissionais) é fator decisivo para o sucesso.

Para ilustrar os comentários, podemos citar:

1. A falta de investimento levou a Antarctica a ser vendida para a Brahma.

2. A integração da equipe e o treinamento levaram a Procter & Gamble a ser uma empresa centenária em constante crescimento, assim como a 3M e a Dupont.
3. A profissionalização transformou o Grupo Ultra em uma das organizações mais lucrativas e perenes do Brasil e, da mesma forma, a Embraer.

Os exemplos de superação estão ligados à capacidade de conhecimento dos mercados onde atuam, na valorização do lucro, no investimento contínuo, no cuidado com os recursos humanos, e na capacidade estratégica da direção das empresas e de seu autoconhecimento.

Ronaldo Bianchi

Quando tratamos de previsibilidade, é muito importante ficar atento às possíveis políticas públicas ou a sua falta.

A política de juros e câmbio praticado pelo governo federal é fator relevante para as indústrias manufatureiras locais. É fácil perceber sua influência quando o cenário aponta para juros altos, real apreciado e inflação em alta. A indústria sofrerá nas vendas, acarretará em obsolescência do parque industrial e, portanto, perderá valor. Esse cenário foi comum em todas as crises dos anos 90. No governo Fernando Henrique a indústria brasileira sofreu grande desgaste e desajustes. Faltou crédito a longo prazo, para que as empresas brasileiras pudessem criar condições competitivas e sustentarem-se. Muitas delas fecharam ou faliram. Foi uma devastação, um período de alta volatilidade no desempenho das vendas e da lucratividade. O emprego na indústria foi reduzido, principalmente nos setores caracterizados pelo emprego de baixa tecnologia e mão-de-obra intensiva.

A indústria metalúrgica no setor de manufatura de alumínio sofreu muito nesse cenário. Naquele momento, as grandes empresas do setor iniciaram a sua consolidação e, por meio da liderança de mercado, a Panex fez valer seu protagonismo. As grandes marcas Panex, Penedo, Clock e Rochedo eram indústrias separadas e de origens diferentes. As três primeiras, brasileiras, e a última, uma subsidiária da Alcan (canadense). Em poucos anos, as quatro uniram-se em uma única que, logo depois, foi vendida para a maior empresa americana de manufatura de alumínio e aço. Cenário instável, volátil e sinuoso. A empresa voltou a ser propriedade brasileira quando o então presidente Ricardo Cury e seus diretores a compraram, já consolidada, dos americanos. Diga-se que Ricardo e seus irmãos eram os dirigentes da Panex e mentores da consolidação das maiores marcas de utilidades domésticas de alumínio. Uma história a ser contada.

A indústria têxtil sofria do mesmo mal da metalúrgica (baixo emprego de tecnologia e mão-de-obra intensiva), em outras palavras, a velocidade da máquina era inferior aos concorrentes internacionais, sofrendo, ainda, o alto custo das obrigações trabalhistas brasileiras em relação aos asiáticos. A indústria que mais se destacou nesse período foi a de José Alencar – Coteminas – por meio de uma estratégia vencedora: consorciando investimentos em tecnologia e endividamento a longo prazo, longe dos bancos comerciais. Criou uma das mais preparadas organizações a nível mundial. Conquistando posição singular na cadeia da manufatura: do fio à confecção. Todos os processos foram extensamente modernizados e verticalizados. A ousada estratégia deu certo pelos motivos já apontados, somando-se à criação de um espírito de equipe sólido, comandado por Josué Gomes da Silva, filho do fundador.

Foram dois exemplos de sucesso, apesar de um cenário de crise constante, mercado volátil, onde juros altos, real apreciado e invasão de artigos importados eram uma constante.

Ronaldo Bianchi

A história das organizações nos coloca que é uma verdade dentro de um prazo de tempo. Não há futuro indefinidamente previsível. Qual é o prazo de validade da previsibilidade? Isso dependerá: das forças que dirigem as organizações, como a maturidade dos seus mercados de atuação, dos ciclos econômicos de produtos ou serviços que realizam, de sua direção executiva, das intenções de seus acionistas, das regras governamentais, das condições macro-econômicas do país onde atuam (vale o plural para as multinacionais), das condições naturais (meio-ambiente) e dos avanços tecnológicos.

Há 20 anos, tínhamos como prever que organizações como Amazon e Facebook apareceriam com a força que irromperam? Da mesma forma, não pudemos imaginar que o mundo corporativo nos apresentasse situações críticas como em 2008. Além da crise que agora, no final de 2011, apresenta-se com um conjunto relevante de países europeus falidos e no limite de um calote histórico.

Como as organizações poderiam garantir-se nessas condições gerais tão adversas?

Primeiro, cabe avaliar se o seu negócio tem futuro, Se você é uma indústria e produz brinquedos, seu horizonte dependerá: da taxa de natalidade, dos insumos importados, da taxa de câmbio, das sobretaxas de importação, das atualizações dos seus concorrentes, da capacidade das empresas atuarem em conjunto no sentido de protegerem seus interesses coletivos. Outro exemplo seria o das empresas do setor de serviços, onde as condições estratégicas dependerão de: qualidade da operação, regras do setor de atuação, interesses de outras organizações (empresas globalizadas carregam fornecedores globalizados), satisfação dos clientes, lucratividade real do negócio.

Algumas áreas de prestação de serviços ainda são muito informais em suas contratações, fato que cria condições de alto risco trabalhista e futuro passivo. Algumas empresas como as de assessoria de imprensa e comunicação são típicas no descumprimento das leis trabalhistas. Há um pacto entre empregador e empregado para a desobediência às leis, que impacta negativamente na arrecadação previdenciária e, até mesmo em alguns casos, refletem em situações como evasão fiscal.

Essas condições de descumprimento coletivo aceleram a imprevisibilidade do seu futuro. Como não há cumprimento generalizado das normas, os aventureiros tendem a crescer em maior velocidade do que aqueles que cumprem suas obrigações. Porém, seu prazo pode ser curto, caso haja uma conscientização dos prejudicados com esse ambiente. Aos prejudicados, caberia procurar as autoridades e dar cabo dessa situação lesiva à livre concorrência.

Nos próximos artigos iremos abordar outros setores e exemplos.

Ronaldo Bianchi