O CONSELHO E AS ORGANIZAÇÕES III

A prática brasileira de uso de conselho consultivo, administrativo, deliberativo e fiscal é ainda pouco disseminada. Quando existe, é por obrigação legal, seus membros são acionistas ou diretores da própria empresa. A prática do conselheiro independente é exceção. Não há segregação funcional entre executivo e suspensão dos sócios, tudo se mistura.
Quais as vantagens da contribuição de membros independentes?

1. Qualquer empresa precisa de um olhar desvinculado da prática habitual de usos e costumes. A cultura da organização precisa ser questionada para estar atenta às mudanças de mercado, portanto, a contribuição de profissionais independentes poderá ser muito eficaz.

2. A empresa poderá estar em fase de expansão, e trazer um conselheiro com experiência em gestão de desenvolvimento é de fundamental importância, pois encurta a curva de aprendizagem na absorção de novas empresas ou na sua própria expansão.

3. Empresas que por problemas entre sócios poderão perder seu vigor, devido a sua precária comunicação. A participação de conselheiro habilitado na condição de arbitragem poderá ser útil na superação da crise.

4. Empresas em crise de caixa, declínio de produtos, envelhecimento administrativo. A introdução de conselheiros que possam arejar e reestruturar a organização, talvez seja a oportunidade definitiva de sua reabilitação.

5. No caso de empresas em processo de reabilitação judicial, nem se discute. Conselheiros poderão realizar a reformulação exigida pelos credores e reabilitar a organização.

Como os acionistas devem escolher a composição do Conselho?

1. Por equilíbrio societário – para que as forças estejam representadas de forma equânime e simétrica.

2. Por competência – escolher nomes que possam contribuir para o progresso da empresa, excluindo a possibilidade de nepotismo, e critério de escolha por “necessidade” familiar.

3. A escolha por conselheiros independentes deve objetivar o momento vivido pela empresa, prevalecendo critérios como o preenchimento de lacunas quanto ao conhecimento técnico, relacionamento e experiência específica.

4. É obrigatória a algumas empresas, a participação de representante do corpo funcional. Cabe à direção, comunicar a importância do cargo e o estímulo a uma participação cooperativa a toda a empresa.

5. Ouvir os analistas de mercado sobre possíveis nomes que possam agregar confiabilidade, isenção e transparência aos atos decisórios, valorizando a gestão da empresa e aumentando seu valor de mercado.

O fato real: santo de casa faz milagre, mas precisa de ajuda externa.

Ronaldo Bianchi

O CONSELHO E AS ORGANIZAÇÕES IV

O formalismo do léxico econômico social distinguiu, em determinado momento, a divisão do trabalho por setores:

. Primeiro Setor – Governo
. Segundo Setor – Mercado
. Terceiro Setor – Sociedade Civil
. Quarto Setor – Crime Organizado

No passado, a visão preponderante estava ligada ao Censo, onde os setores econômicos são: extração, agricultura, indústria, comércio e serviços.

A primeira alternativa é mais abrangente porque inclui a visão econômica praticada na realização do Censo.

Nessa condição, os estudos do terceiro e do quarto setor são importantes para o entendimento da dinâmica social.

Nos Estados Unidos da América, participar de um Conselho de Administração em uma entidade sem fins lucrativos é um dos maiores reconhecimentos sociais almejados. A sociedade americana está baseada em valores cristãos. O enriquecimento se realiza através da ética do trabalho, fato, aliás, muito bem explorado por Max Weber em seu estudo “A ética protestante e o capitalismo”. Cabe ao enriquecido distribuir parte de seu ganho para as causas humanitárias como forma de retribuição de sua sorte. Além de revelar uma conduta diária de resignação, opondo-se a uma conduta pessoal de extravagância. A sociedade americana reconhece a participação de seus membros em Conselhos de organizações não governamentais como algo singular, relevante e meritório. A participação é acompanhada de generosas contribuições em dinheiro, bens e prestação de serviços.

A Lei Americana da Benemerência, de 1917, consolida uma antiga prática americana: a partir desta lei, as doações passaram a ser descontáveis, parcialmente, do imposto de renda a pagar, tanto de empresas quanto de pessoas físicas. A lei é ainda vigente.

O caso dos Conselhos de entidades brasileiras tem a característica diversa, cabendo mais a situação de pertencer, sem a obrigação de doar. Na prática, trata-se de gerir doações de terceiros e do Estado. As leis de incentivo às práticas culturais, esportivas e filantrópicas estão lastreadas na renúncia fiscal e, como consequência, ampliaram a participação do Estado em detrimento da contribuição privada. Hoje, é comum Conselhos serem formados por representantes de empresas, na expectativa de alcançarem doações lastreadas nestas leis. A segunda característica é o formato muito numeroso de governança.

Existem Conselhos com 80 membros, como é o caso do Museu de Arte de São Paulo. A terceira é a condição restritiva, imposta pelos estatutos, à reposição dos membros do Conselho. O sentido natural seria a escolha de membros dentro do agrupamento dos sócios, fato que, em regra, não corresponde à realidade. O Conselho arregimenta novos membros dentro de critérios de afinidades pessoais e/ou sociais, no limite do potencial econômico. A formação do Conselho de organizações sem fins lucrativos necessita de reformulações. Critérios técnicos de escolha de seus membros, sua independência frente à diretoria e redução do número de membros seriam medidas adequadas à adoção de boas práticas ainda incomuns em nossas organizações sem fins lucrativos.

Ronaldo Bianchi

O CONSELHO E AS ORGANIZAÇÕES I

Abordarei o papel do Conselho em três tipos de organização: estatais/públicas, privadas e sem fins lucrativos. Formarão um conjunto de artigos com o objetivo de destacar as peculiaridades de cada quanto a:

1) Forma de comportamento dos dirigentes;
2) Estilo de procedimento para a rede de relacionamento;
3) Acompanhamento de resultados e gestão de recursos.
4) Formação do Conselho.

Iniciarei com as estatais/públicas, obedecendo a lógica setorial: primeiro, segundo e terceiro setor – governo/estado, mercado e sociedade civil, respectivamente.
Há empresas estatais, autarquias e fundações que são sociedades fechadas. O capital é estatal, sem participação de qualquer ente do mercado. As ações ou composição acionária são restritas ao Estado que as criou. Em São Paulo, são exemplos: EMPLASA – Empresa de Planejamento S.A.; IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas; CPOS – Companhia Paulista de Obras e Serviços, empresas públicas com capital exclusivamente formado pelo tesouro do Estado. Quem nomeia seus conselheiros e diretores é o poder executivo, em particular, a Secretaria vinculada e o governador. O governador nomeia os dirigentes executivos e seus conselheiros por mandato, escolhendo, de uma forma geral, pessoas vinculadas ao governo, ocupantes de outros cargos públicos, antigos dirigentes e algumas autoridades do setor em tela.

A “descoberta” da governança corporativa nesse tipo de organização é recente. Geralmente, o Conselho era uma forma de completar a remuneração do dirigente de órgãos do executivo como chefes de gabinete, secretários adjuntos, secretários e outros dirigentes de organizações públicas. A nova legislação compromete o conselheiro quanto aos atos praticados pela organização. Oque era mera formalidade, começou a se reverter para compromisso solidário. Hoje, é comum o Conselho exigir dos executivos, uma apresentação profunda das condições estruturais e funcionais desse tipo de organização como: balanços mensais, mapas de risco, relatórios de desempenho, acompanhamento das lides jurídicas, exigências emanadas pelos órgãos fiscalizadores como Tribunal de Contas do estado e Corregedoria da Secretaria da Fazenda.

O aparelho fiscalizador do Estado passou a ser muito mais ativo a partir de 2006, quando foram criadas várias forças tarefa que culminaram com a formação de equipes permanentes de fiscalização. Diga-se que, a princípio, aquém da qualidade exigida pela função, e muito preocupadas com a formalidade dos atos. Creio que levarão anos até entenderem que a vigilância dos resultados acompanham “pari passu” a obediência ao campo legal (o conjunto de leis e normas) que regulamentam a organização.

As empresas estatais ainda carecem de um projeto de intenso relacionamento intragoverno e sociedade. Elas prestam pouca atenção às funções de responsabilidade social, ocupando muito do seu tempo no atendimento aos órgãos regulatórios e fiscalizadores. Caberia ao próprio poder público, criar modelos voltados ao melhor desempenho. Em sua rede de relacionamento, ainda há uma atenção exagerada no atendimento aos interesses da Secretaria vinculada. Pouco se concretiza na divulgação e no uso dos produtos que a organização gera para a sociedade e outros órgãos públicos.

Creio que um organismo do planejamento deveria se responsabilizar pela articulação das estatais e seus produtos. Vejo essa possibilidade com otimismo, pois a governança corporativa assinala essa direção.

Ronaldo Bianchi

O CONSELHO E AS ORGANIZAÇÕES II

As empresas públicas de capital aberto – S. A. – tem seu Conselho apontado por seus acionistas e em todos os casos há uma representação dos funcionários. Hoje, é uma obrigação legal.
De forma diversa das empresas públicas de capital fechado, o Conselho sofre influência dos acionistas minoritários, dado que parte de seu capital é pulverizado via Bolsa de Valores.

Os exemplos federais de empresas abertas mais importantes são: Petrobras, Eletrobrás e Banco do Brasil. Há casos de empresas estaduais de capital aberto como a Sabesp, no caso paulista. A escolha de seus conselheiros ainda é uma equação política e não técnica. A maioria das escolhas recai em nomes de confiança do governo ao qual está relacionada.

A figura do conselheiro independente ainda não é uma realidade. Dessa forma, a busca por um desempenho diferenciado, pela competência no mercado em empresa pública S. A. aberta, ainda não acontece. A sua estrutura de governança não se aprofunda na prospecção de alternativas para o desempenho econômico e financeiro, obedecendo às linhas do governo empossado no aparelho de Estado. Portanto, componentes políticos inibem ou desvirtuam sua função de empresa, fato visível na Petrobras, onde por diversas vezes, os jornais noticiam o atraso na majoração de preços ao consumidor para influenciar os índices inflacionários. Essa intromissão derruba o valor da empresa, a sua política de preços e a sua lucratividade não ficam transparentes. Quando a empresa pública torna-se uma operação de manobra de governo, a imagem fica comprometida. Não critico o fato de a estrutura do capital ser pública, mas a interferência do governo em sua política de gestão de recursos.

Essas operações deveriam obedecer a um conselho com maior independência, blindado da interferência do poder executivo ou sua vitimização pelo poder legislativo. Quem sofre com a má gestão da empresa pública S. A.? São os seus acionistas minoritários como toda a nação, quando o desempenho não ocorre em sua plenitude e é a própria empresa que perde recursos para seu progresso. Portanto, o mercado sabe quando a empresa está abaixo de sua potencialidade. O valor das ações refletem condições especulativas devido à fraca expectativa de reconhecer potencialidades estruturais de seu desempenho.

Talvez, algum dia, possamos ver algo diferente do que existe hoje.

Ronaldo Bianchi