As emissoras de televisão, de uma forma geral, adotam como linha de conduta jornalística, a transmissão de noticiário factual, procurando evitar a interpretação dos fatos. O conteúdo jornalístico tem mudado, no passado, há 30 anos, o noticiário noturno do horário “nobre” era conduzido pautando pela ordem de assuntos locais, nacionais, internacionais e, em destaque, assuntos esportivos, especialmente o futebol. A emissora estendia-se nesse tema, reportando as últimas tendências dos principais clubes do eixo Rio-São Paulo. As alterações começaram a ser mais significativas a partir da instalação de jornais eletrônicos no horário de almoço (a Tupi foi pioneira com o Tico Tico na década de 60). Mais tarde a Record criou o que ficou conhecido como o Jornal da “Tosse”, chacota à idade média dos comentaristas.

A partir desse modelo (cópia dos jornais matutinos da Rádio Bandeirantes), as emissoras instalaram seu jornalismo de debate. Foram tão importantes que pelo menos dois participantes foram eleitos deputados: José Serra e Faria de Sá. Esse último, como defendia os aposentados, desbragadamente, foi eleito por esse segmento da sociedade. Na década de 60/70, dois comentaristas de futebol foram eleitos vereadores paulistanos, Valter Abrão e Geraldo Blota, e outro guindado Conselheiro do Tribunal de Contas do Município de São Paulo: Paulo Planet Buarque. Vale lembrar que Valter Abrão também foi nomeado conselheiro anos depois. Essas relações entre mídia e cargos públicos ficaram cada vez mais freqüentes. Na última eleição, vimos a enxurrada de candidatos cantores, jogadores, jornalistas e estilistas. Alguns alcançaram a eleição, o palhaço conhecido como Tiririca foi o artista candidato mais votado do país, com cerca de um milhão e meio de votos.

Concluímos, portanto, com a certeza de que a exibição pública por meio televisivo é um caminho seguro para quem quer trilhar a vida pública. Creio que o ex-presidente Lula faria muito bem o caminho inverso, podendo desbancar Silvio Santos, Fausto Silva e Luciano Hulk, mas isso é troça.

Voltando ao editorial jornalístico, poucas vezes ouvimos o posicionamento das emissoras frente a algum fato. Lembro-me da Rede Globo protegendo-se dos ataques do Brizola. O comum é não emitir qualquer editorial, as preferências surgem das bocas dos debatedores de notícias.

Em anos mais recentes, surgiu o jornalismo “verdade”, baseado nas desgraças humanas: crimes, desastres, doenças, entre outros. Neles, o apresentador faz críticas cáusticas às secretarias de segurança pública, ao departamento de trânsito, aos sistemas públicos de saúde e de previdência. Fazem o seu trabalho, podem ser apelativos, algumas vezes, poderiam ser evitadas cenas chocantes, porém, num país tão estranho, onde não há críticas, é uma novidade interessante. Datena, Cabrine entre outros, se fossem candidatos seriam deputados ou senadores (como foi um dia o global Hélio Costa, de Minas Gerais).

As mudanças se aceleraram com a televisão a cabo. Nesse restante, o público mais exigente e com maior renda migrou da televisão de sinal aberto para os canais por assinatura. Há 11 anos, surgiu a Globo News, um canal como o da CNN americana, onde as notícias passam a ser o núcleo da programação, entremeando notícias, entrevistas e documentários de conteúdo jornalístico. Excelente canal, diga-se. Nessa condição não há espaço para o apelativo, popularesco ou demagogo. É um jornalismo atuante, fugindo muito do antigo modelo jornalístico factual. Agora, o comentário é a razão de ser do programa.

Caberia à televisão pública um papel de protagonismo, quando a independência da redação frente aos patrocinadores se fez necessária. Assuntos como taxa de juros, precariedade do atendimento das agências bancárias, baixa eficiência dos provedores de internet, mau atendimento das lojas virtuais, mazelas da indústria que rouba no peso e na metragem entre outros, não seriam muito bem vistos pelas empresas que atuam nesses e em outros segmentos como patrocinadores do jornalismo. Teoricamente, o jornalismo público deve ocupar esse espaço de debate e ajuste de conduta. As emissoras públicas deveriam atuar nestas zonas cinzentas, abrigando essas discussões não para comparar-se ao jornalismo sensacionalista, mas seria a possibilidade de explorar a mesma situação por diversos ângulos. Analisar a razão de a taxa de juros brasileira ser a segunda (hoje) maior do mundo deveria ser um debate com os atores presentes: bancos, governo, empresários e sociedade. Esta é a hora. Esta seria a função do jornalismo público, sua conduta editorial.

Não há espaço crível onde o comercial domine o editorial, e nem onde o político paute a direção jornalística. Governo e Mercado precisam ficar de fora das redações.

Cabe ao jornalismo público, como também ao bom jornalismo das redes concessionárias privadas, a obrigação de ouvir todos os lados de uma questão. Caso contrário, será reconhecidamente uma atitude descredenciada de valor.

Hoje, nos tempos da rede mundial, a verdade tem mais interpretações do que no passado, ontem, um canal ou um jornal poderiam derrubar um governo, um projeto de lei ou qualquer membro dos poderes da república. Hoje, a informação é mais rápida e contundente, porém pode ser mais apropriada. Em que condições? Em primeiro lugar, o seu direito de resposta a uma acusação pode ser abrigada nas redes sociais e os fatos esclarecidos antes de se tornarem um escândalo injusto.

Creio que seja um assunto inesgotável, mas por esse artigo, damos cabo sobre o assunto do comportamento editorial.

Ronaldo Bianchi

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